quarta-feira, 9 de março de 2011

As minhas vidas secas

Tava sentado na sua cadeira costumeira, a de vime, achada nos achados de uma leva de coisas inúteis a serem descartadas. Aquela cadeira de vime mais antiga que o seu orgulho macho.

Quasímodo casmurro. O trabalho havia cansado seus ossos magros e a pele seca, início de velhice. Ainda restava uns vestígios de virilidade nos braços, contudo o olhar dizia ter visto muitos sóis, lá, longe, nos anos corridos e jamais alcançados. E o corpo pendia à velhice.

Era meu anti-herói, corroído pelo tempo; cúmplice d'um sequestro: o da paternidade. Foram infâncias e jovialidades que ele não viu de mim. Uns erros tamanhos e acertos infames. Não deu tempo, o trabalho o consumiu. Não deu tempo de olhar para cima e ver o homem que antes fora bebê, seu bebê.

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As mãos macias cheirando à alho e cebola. Todo um tronco sensual, rita-baiana-morena-clara-de-capitolina-só-o-sufixo. Recato do século XIX e tantos outros regalos de instinto maternal. Mexia cansada e conformada no fogão, preparando, de joelhos, a sobrevivência para os filhos e o patrão.

Um relicário de renúncias, mural de denúncias.

Tava sonhando em voltar aos anos dourados, ao brilho da glória, da beleza, à frente do palco e não da pia. Digna de ser rainha. Tava ousando, e eu fiquei feliz. Ousou e eu estou muito feliz.

Olhou para mim e viu o homem que ainda era o seu bebê.

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Correu do trabalho pra casa. Umedeceu o corpo leve com cheiro de canela e castidade, correu para a faculdade. Se não, tava aqui, tecendo conversa que não consegue nem fazer nó se for ao vivo. Resmungou uns tons suaves e infantis? Não... Dessa vez me deu silêncio fraternal.

Penetra o coração de todos - com ausência.
Grita, esperneia, irrita e tenta sobreviver. Eu quero abraçá-la.
Cala-se diante do externo, comprimi o interno... Ninguém vê o que se passa.

Nem Deus.
(Que Ele cuide de sua alma, por favor).

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Hoje mal latiu. Encostou o corpo já um tanto ansião na parede, a cabeça pendeu para a direita, depois se apoiou entre as patas. Uns tempos... Depois cansou e partiu para outro lado.

Do quintal, só para voltar ao sono.
Mas tá melhor, eu juro. Eu amo. Belisca a ração e até corre de vez em exceção; Engana que é filhote, engana que é eterna.

(ela não, eu). necessito.

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Eu lírico. Graciliano? Jamais.
Tava feliz, tava triste, tava esperançoso, tava rendido.
Meio Capitu, meio Bentinho; meio G.H., meio Leonardinho.

Deixei de dissimular, as noites que se façam atraentes! Tenho comigo o tédio e melancolia d'uma crisálida - e nem prometo borboleteios:
... é que to mais para barata, vazia de tudo, semi morta(ou semi viva?),
malandro ocioso
poeta
daqui e dali, inútil.
Poeta.


Magia, Paixão e Poesia - Decifra me enquanto te Devoro

5 comentários:

  1. tiro o chapeu e aplaudo de joelhos. meu preferido, sem dúvidas. memorável, vai entrar pra lista de melhores já lidos; deu vontade de conhecer todos, pai, mãe, cachorro, papagaio, tudo o que te cerca e faz toda a rotina virar essa poesia deliciosa. e agora perguntemos: cade o teu livro, hein ?!


    beijo.

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  2. todo esse sentimento que você usa pra escrever, nunca te deixar vazio e mesmo que o vazio venha, uma vez eu li que até o vazio preenche o vazio.

    você poderia ser meu professor de literatura, quem sabe assim eu não iria perder o trauma que me foi causado no ensino médio, hein hein?! ((:

    beijas, poeta :*
    []

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  3. Fil, agora em processo de letrado e eternamente casado com o dom de escrever *-*

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  4. Sem nenhuma dúvida POETA....
    Qualquer comentário seria em vão, quando se tem o DOM, não é preciso mais nada.
    Beijos com carinho!

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  5. Às vezes me sinto confusa, mas sinceramente? Escreves bem demais! :D

    sobre um Álvaro sobrando? Eu tenho a 'posse' de um e está muito bem guardado. Mas por aí tem outros Álvaros, pode ter certeza AUHEUAHE
    :***

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