segunda-feira, 28 de março de 2011

domingo, 27 de março de 2011

Paixão, Pintura e Poesia (Final)

"[...]

Em meio a quadros destroçados encontraram o corpo inerte da reclusa pintora morta, com o rosto acariciando a face da única obra quadro que restou intacta. Essa era incrivelmente bela, principalmente pelo brilho nos olhos da moça retradada, quase que vivos e totalmente perfeitos. Fabuloso! Póstumo e fabuloso. Junto ao corpo e ao quadro também encontraram esta poesia:


Da poetisa à D’alva, por meu anjo pintor:

“O azul celeste dos céus com o manto da noite se recobre.

A treva de meu peito reluz com a mais bela poesia,

são teus lábios puros que marcam a dança da maresia.

Em pleno Oceano Lunar o teu amor me escolhe

E eu faço uma prece à estrela mais brilhante, à D’alva:

Que eu tenha o calor necessário para te abraçar

Que com a paixão imortal eu seja abençoada

E que em meus braços prossiga a carregar

A tua alma, anjo da arte, minha amada.

Seguro a tua mão trêmula, gélida

e guio-te à luz refletida por tua obra prima,

ode ao nosso amor escondido nesta rima.

Seguro tuas asas tão dilaceradas

de vôos sofridos, tuas quedas afogadas...

Ah, criatura sonhadora, tentaram os anjos da escuridão

consumirem a esperança doce de tua ascensão.

Tentaram contra o calor de tua alegria tão terna

mentindo ao teu espírito, pois é chama eterna.

Tu és quem acalenta-me no paraíso,

És quem saudosa, dedico esta póstuma elegia.

És anjo, então angelical, como não a amaria?

Ecoarei em ti a poesia da devoção sincera

Por teus olhos, teus lábios celestiais...

...e te amarei infinitamente mais.”

Clara."


Magia, Paixão e Poesia - Decifra me enquanto te Devoro

quinta-feira, 24 de março de 2011

Paixão, Pintura e Poesia IV

[...]

Desnuda de qualquer esperança em ser algo além do encantamento do passado, da entrega à arte (porque ser um ser incompleto a tragava cada vez mais), Annabelle se segurava na vida unicamente por aquele quadro; quando terminado se eternizaria junto a face de sua bela flor e despencaria até os braços de sua terna poesia. Então veio a chuva enfeitada de relâmpagos e bravios trovões. Já se ouvia ao longe o soar do fim dos tempos e uma decadente marcha funérea acompanhada de olhares penosos e distantes – talvez alguns perplexos – se vislumbravam na mente de Annabelle. A angústia era solene mas o alívio era macabro; os braços trêmulos tentavam não violar a última pincelada da sua obra prima.

A última chuva.

O anoitecer cobria seu apartamento iluminado por velas e lágrimas de adeus. Tudo completo, divino, fatal.

Até a estupidez humana retomar a cena.

Barulho.

Gritos silenciosos.

Gritos insanos.

Desespero. E o fim.

Um grupo de jovens sem sentido fazendo uma anarquia sem sentido.

Uma jovem sem sentido perdendo sua vida sem sentido.

E o fim da tempestade, a última dor.

A magia se findava, as águas do céu se findavam, a madrugada tornava solitária e Annabelle chorava confusa por aquele arrombamento em sua vida, tremendo de loucura porque o maior dos pecados aqueles seres inválidos haviam cometido: ébrio de insanidade, aquele momento consumiu qualquer estilhaço de luminescência que ainda tentava permanecer em Belle. Com a dor maior do mundo ela caiu sobre sua tela inacabada e imperfeita, pedindo perdão, desesperada por dessa vez não poder salvar sua musa. Um último beijo apaixonado depositou naqueles lábios salgados e com suas lágrimas inundou o olhar opaco de Clara. Jazia ali um sonho destruído, no chão de um apartamento revirado em bagunça sem sentido dentro de um mundo sem sentido.

O pranto que ali se desfez derramou toda uma vida e essência, tingindo a arte agora com o maior dos tesouros: ágape.

Assim, possuída por si mesma e por aquela outra parte pulsante, clara e poética, dormiu profundamente Annabelle.

A manhã veio fria de morte.

[quase no fim]

Magia Paixão e Poesia - Decifra me enquanto te Devoro

segunda-feira, 21 de março de 2011

Pra 'ele' ♥


[uma poesiasinha para meu lindo que faz 20 outonos hoje, 22 de março] [te adoro, querido!]

.

"Vem a mim teu olhar, teu querer

tão alegre, tão amigo
Trocando toques, querendo ter
meu afeto tão assíduo

E tens, sim, sobre um coração de amor
a minh'alma sensível, deliciada com teu sabor
Meu anjo lindo, pleno e precioso
Salvaguardado num encanto puro e brando

Te quero sim, de todos os modos, tecendo
uma história de teus e meus anseios,
tecendo toda uma teia de devaneios

Te amo sim, consumido e consumado,
infinito dançando elucidado
e te amo, te amo, amo, amo de tamanho imenso.

Hoje muito...(amanhã ainda mais intenso)."

.

Magia, Paixão e Poesia - Decifra enquanto te Devoro

sábado, 19 de março de 2011

Paixão, Pintura e Poesia III

[...]

“O mar não é cruel”, ecoava no pensamento de Annabelle. “O ser humano que é”. E a vida, sua cúmplice, rainha da Morte: sua fiel escrava.

Que tipo de conto é esse que conto a você?

Que tipo de conto de fadas é esse que minto a você?

Aquele que mascara com poesia a linha fria e crua onde segue a História Real.

Risos tímidos, risos extravagantes.

Um pingente de prata, nomes mágicos.

A manhã cobrindo aqueles rostos radiantes.

Um fabuloso buquê de rosas brancas e vermelhas.

Poesia.

Uma aliança.

Lágrimas incontidas.

A Perfeição. E o Fim.

A bala e o fim. O desespero estúpido de um inválido pisado e o fim. Pisado.

O peito da poetisa sangrava em cachoeira sem retorno ou esperança. Num chão de calçada, numa manhã de domingo, assaltada e ceifada sem o menor sentido, sorrindo para o mais desesperado dos rostos. Escorria cachoeira de poesia e dor – morria uma estrela.

Clara foi enterrada com seu pingente ao pescoço e em sua homenagem foi lida uma de suas jamais publicadas elegia à Morte. Também consigo, cravada eternamente em sua pele gélida fora enterrado todas as carícias e luz de Annabelle, dando inicio a Era da Escuridão. Fútil e recôndita história de “Belle Meu Coração Quer Parar”.

Agora, do presente restou um pequeno tesouro: nas madrugadas sem sono a magia renascia na tela e sob o podre do chiaroscuro, Belle pintava o retrato mais lindo, a dádiva mais linda ao seu anjo caído e roubado. A única dor desse trabalho apaixonado se concebia no olhar de Clara, opaco e incompleto. Apenas em dias de tempestade é que o brilho das águas banhavam a inspiração da pintora a criar os olhos perfeito para sua amada.

Entretanto há tanto tempo não chovia impetuosamente! E os dias se passavam cada vez mais árduos e insignificantes. Até a última tempestade:

[continua]

Magia, Paixão e Poesia - Decifra me enquanto te Devoro

segunda-feira, 14 de março de 2011

Paixão, Pintura e Poesia II

[...]

Passado que massacrava mais uma inválida no mundo, assim como os milhões de universos fechados ambulantes pelas ruas, caminham os inválidos massacrados em seu silêncio e em suas histórias destinadas ao pó do esquecimento. Clara não podia! Aquela alma tão querida e amena que fora brutalmente violada e enviada ao sétimo palmo da terra jamais poderia ter sido em vão, Annabelle não aceitaria. Era seu imenso amor perfeito...

Nossa heroína desfeita do dia das bruxas nem sempre fora trancada ao mundo qual uma bíblia fechada numa gaveta esquecida. Pelo contrário, Annabelle vivia de risos e êxtases da juventude, vestida de alegria, voando solta sob sua própria atmosfera; sua presença cheirava a melissa. Introspecção era uma parte secreta naquela alma avivada. Secreta nos olhos daquela que fazia brotar sorriso bobo e infantil em Belle: Clara.

Poetisa por natureza, delicada e silenciosa, sempre tranquila. Seu aroma era de café pela manhazinha e seu abraço era incrivelmente maternal desde pequenina. Assim pequenina que enlaçou a melhor amizade à Annabelle e a ela dedicava cada versinho encantado, poema maldito e contos fantásticos de embriaguez apaixonada. Enquanto Clara se derramava em delírios da meia noite, Belle irradiava pinceladas de fogo em pleno meio dia. Pincéis que vertiam aquela criatura expansiva e brilhante em arte intensa e abstrata. A pintora e a poetisa. Sem famas ou luxo, apenas a certeza prisioneira-libertadora de que para a Arte tinham nascido e da arte juntas morreriam. Morreriam... Principalmente depois do primeiro (e único) beijo, o salvador. Nada que não tenha acontecido em filmes, nada simples quanto neles! A loucura da adolescência é se jogar ao mar em maré de escuridão, figurativa e literalmente falando, como as duas resolveram fazer. O horizonte se confundia entre o negro do mar e o negro do céu – ambos refletindo seus mistérios um no outro, sendo um só como a pequena e insensata Belle, convidando a sonhadora Clara a banhar-se de lua e sal. Apenas as duas.

E tendo também apenas uma a outra, o coração de Annabelle quase se afogou quando viu sua paixão inocente perdendo os sentidos, entregue ao desfalecimento no centro da praia maldita-adorada. Mas o mar não é cruel para os que compartilham sua alma oceânica e bastou um pequeno fôlego de doçura nos lábios salgados de Clara para ressuscitá-la e.

Renascer.

Nos lábios de sua paixão proibida, roubando-lhe mil beijos na areia da praia e ali mesmo sendo um só corpo e alma, no pecado do amor, dando inveja ao mar que jamais tocará o céu enluarado.


[continua]

Decifra me? Devoro-te.

quarta-feira, 9 de março de 2011

As minhas vidas secas

Tava sentado na sua cadeira costumeira, a de vime, achada nos achados de uma leva de coisas inúteis a serem descartadas. Aquela cadeira de vime mais antiga que o seu orgulho macho.

Quasímodo casmurro. O trabalho havia cansado seus ossos magros e a pele seca, início de velhice. Ainda restava uns vestígios de virilidade nos braços, contudo o olhar dizia ter visto muitos sóis, lá, longe, nos anos corridos e jamais alcançados. E o corpo pendia à velhice.

Era meu anti-herói, corroído pelo tempo; cúmplice d'um sequestro: o da paternidade. Foram infâncias e jovialidades que ele não viu de mim. Uns erros tamanhos e acertos infames. Não deu tempo, o trabalho o consumiu. Não deu tempo de olhar para cima e ver o homem que antes fora bebê, seu bebê.

-

As mãos macias cheirando à alho e cebola. Todo um tronco sensual, rita-baiana-morena-clara-de-capitolina-só-o-sufixo. Recato do século XIX e tantos outros regalos de instinto maternal. Mexia cansada e conformada no fogão, preparando, de joelhos, a sobrevivência para os filhos e o patrão.

Um relicário de renúncias, mural de denúncias.

Tava sonhando em voltar aos anos dourados, ao brilho da glória, da beleza, à frente do palco e não da pia. Digna de ser rainha. Tava ousando, e eu fiquei feliz. Ousou e eu estou muito feliz.

Olhou para mim e viu o homem que ainda era o seu bebê.

-

Correu do trabalho pra casa. Umedeceu o corpo leve com cheiro de canela e castidade, correu para a faculdade. Se não, tava aqui, tecendo conversa que não consegue nem fazer nó se for ao vivo. Resmungou uns tons suaves e infantis? Não... Dessa vez me deu silêncio fraternal.

Penetra o coração de todos - com ausência.
Grita, esperneia, irrita e tenta sobreviver. Eu quero abraçá-la.
Cala-se diante do externo, comprimi o interno... Ninguém vê o que se passa.

Nem Deus.
(Que Ele cuide de sua alma, por favor).

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Hoje mal latiu. Encostou o corpo já um tanto ansião na parede, a cabeça pendeu para a direita, depois se apoiou entre as patas. Uns tempos... Depois cansou e partiu para outro lado.

Do quintal, só para voltar ao sono.
Mas tá melhor, eu juro. Eu amo. Belisca a ração e até corre de vez em exceção; Engana que é filhote, engana que é eterna.

(ela não, eu). necessito.

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Eu lírico. Graciliano? Jamais.
Tava feliz, tava triste, tava esperançoso, tava rendido.
Meio Capitu, meio Bentinho; meio G.H., meio Leonardinho.

Deixei de dissimular, as noites que se façam atraentes! Tenho comigo o tédio e melancolia d'uma crisálida - e nem prometo borboleteios:
... é que to mais para barata, vazia de tudo, semi morta(ou semi viva?),
malandro ocioso
poeta
daqui e dali, inútil.
Poeta.


Magia, Paixão e Poesia - Decifra me enquanto te Devoro

segunda-feira, 7 de março de 2011

Paixão, Pintura e Poesia I

Annabelle acordava todos os dias ao despertar do Sol preguiçoso e ainda fresco, alimentando-se do cântico sagrado dos pássaros. Seus olhos semi cerrados denunciavam a pesada insônia que lhe possuía em noites sem chuva e ao redor deles formava uma camada quase que negra, transtornando aquela face quase que angelical e vertendo num visual vampírico e doentio... Os cabelos, ah, os cabelos! Cachos louros e vistosos se emaranhavam um nos outros formando uma aura dourada de precioso ouro.

Era dia, (mais um dia de trabalho).

Ela não merecia. Não que fosse preguiçosa – sim, era - ou que não gostasse de trabalhar. Era aquele trabalho; mais do que os outros, mais do que uma confirmação cada vez mais veemente: ou ela nascera para algo maior ou simplesmente nascera por engano. Que seja! Nenhuma de suas lamentações matutinas ou filosofias angustiadas a deixariam escapar da vida e de ser mais uma na rua, na fria manhã pálida de cada dia, abrindo a porta de sua sala de trabalho e executando as tarefas impostas.

Calça preta social, cacharrel preta, casaco, botas e luvas de couro; lápis delineador preto e um pingente prata – sua única vaidade do dia – em forma de coração divido ao meio. Na face posterior do coração um nome, uma paixão, uma saudade e luto. A caminho do seu destino diário o vento frio lhe batia no rosto branco e seco, penetrando em seus olhos castanhos mentindo lágrimas: é que ela aproveitava aquela brisa que faz umedecer o olhar para prantear as mágoas passadas, presentes e principalmente as futuras.

“Dinamismo”, diziam seus colegas, “puro dinamismo no seu trabalho, Belle!”. Tedioso dinamismo, nada animador, nada que a levantasse e a fizesse sorrir. Cada dia mais silenciosa, Annabelle suportava sua vida como ovelha de sacrifício, resignada e calma por fora – caindo aos pedaços lentamente por dentro. Trabalho monótono, sepulcro lar. Calada, olhar distante e com taquicardia porque mais uma vez parecia que a noite seria estéril e as águas abençoadas do Paraíso não se derramariam na Terra. Passado que se enraizava em torno daquele coração de vidro, esmagando e estilhaçando aos poucos o que de precioso se escondia naquela redoma: uma alma pela metade; um ser vagando com a vida roubada pela morte, puro desdém... Se for, se ficar, tudo tão indiferente... Porém, talvez se fosse, encontraria sua outra parte arrancada em plena luz do dia?

[continua]

Magia, Paixão e Poesia - Decifra me enquanto te Devoro